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Modelo de sustentabilidade do algodão em consórcios agroecológicos com certificação orgânica participativa no Semiárido nordestino é referência para Rede Argentina de Mulheres Algodoeiras


Por Acsa Macena

Evento realizado na província de Santa Fé integrou as ações do Projeto +Algodão na América Latina para consolidação de uma Rede de Mulheres Algodoeiras e visibilidade do papel da mulher nesta cadeia produtiva

Participantes do evento da RAMA. Foto: Doriana/INTA

Uma rede formada para compartilhar experiências e metodologias sobre o cultivo do algodão consorciado na América Latina. Esse foi o foco do Seminário de gestão interna/externa da Rede Argentina de Mulheres Algodoeiras (RAMA), que aconteceu em abril/2023 nas cidades de Avellaneda e Reconquista – Província de Santa Fé – Argentina. O evento foi organizado pelo Instituto Nacional de Tecnologia Agropecuária (INTA) e apoiado pelo Projeto +Algodão, que é executado conjuntamente pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), Agência Brasileira de Cooperação/Ministério das Relações Exteriores e países sócios.

Dessa forma, a iniciativa integra parte das ações que o Projeto +Algodão quer alcançar na América Latina, a partir da consolidação de uma Rede de Mulheres Algodoeiras para dar visibilidade ao papel da mulher nesta cadeia produtiva.

Foto: Doriana/INTA

Nesse âmbito, a Diaconia foi convidada para compartilhar o conjunto de experiências, estratégias, instrumentos, ferramentas e metodologias e resultados sobre a cadeia do algodão consorciado no semiárido do Nordeste brasileiro, com representação da coordenação do Projeto Algodão em Consórcios Agroecológicos. Segundo a coordenadora do Projeto +Algodão Paraguai/FAO, América González, a contribuição da Diaconia foi fundamental para discutir a oportunidade de agregação de valor às produções a partir da certificação orgânica participativa.

“O Projeto +Algodão vê que a mulher tem um papel muito importante na  cadeia produtiva da fibra e que ela está presente em cada um de seus elos, realizando ações de vital importância e gerando renda que contribui para o sustento da família. A contribuição que a Diaconia deixa à  RAMA é importante, pois instalou a questão do Sistema Participativo de Garantia (SPG) no setor de produção de fibras agroecológicas. Embora este sistema ainda não seja legalmente reconhecido na Argentina, a certificação orgânica de produtos agroecológicos da agricultura familiar é uma oportunidade que pode ser promovida para o futuro ”, considera.

Foto: América González/FAO

Na região Semiárida brasileira, o Projeto apoia 7 Organismos Participativos de Avaliação da Conformidade (OPACs) através dos Sistemas Participativos de Garantia (SPGs), que controlam a qualidade orgânica em Unidades Familiares Produtivas (UFPs) à luz da legislação brasileiras dos orgânicos. É a partir dos 7 SPGs/OPACs que são realizadas a comercialização da pluma e fio de algodão em transição e com certificação orgânica participativa, além de outros produtos como gergelim, milho, feijão, girassol, amendoim, sementes de adubação verde, entre outros.

Sendo assim, as contribuições de Diaconia podem servir para fortalecer as capacidades técnicas e organizativas de organizações de base camponesa que estão envolvidas na RAMA com a produção de algodão e alimentos agroecológicos. Entre os principais eixos debatidos, foram a produção agroecológica de alimentos e fibra de algodão, com valor agregado e acesso a mercados artesanais; visibilidade do setor da agricultura familiar, da Rede Argentina de Mulheres Rurais e Indígenas do Algodão; e participação em políticas públicas para o empoderamento econômico das mulheres.

Foto: América González/FAO

De acordo com o coordenador do Projeto Algodão em Consórcios Agroecológicos, Fábio Santiago, foi possível verificar o interesse da RAMA aos SPGs na conferência da qualidade orgânica. “Ficou claro que a experiência do Projeto/Diaconia no apoio aos 7 SPGs/OPACs na região semiárida do Nordeste do Brasil é uma ‘força motriz’ para agregação de grupos de produção em prol do fortalecimento de organizações sociais de base voltadas para a produção do algodão consorciado, criando um ‘tecido social’ de participação territorial e com capacidade de inclusão social. É partir dos SPGs que cria a credibilidade de conferência da qualidade orgânica em Unidades Familiares Produtivas (UFP) e diálogo com os/as consumidores/as que a cada dia querem saber a responsabilidade social, ambiental e econômica dos produtos que se pretendem comercializar. Além disso, é possível avançar nas cadeias de valor dos outros produtos dos consórcios agroecológicos”, observa.

Ainda segundo Santiago, é possível contribuir com iniciativas de outros países que pretendem fomentar o movimento da certificação orgânica participativa como estratégia de promover o desenvolvimento rural com sustentabilidade.

 “Os valores dos SPGs, como confiança, credibilidade, participação e horizontalidade interessam muito à RAMA na perspectiva de organização social da cadeia do algodão agroecológico até a produto artesanal. A experiência da RAMA é pautada desde a produção do algodão em rama, o descaroçamento, a produção do fio e o produto artesanal. Em cada etapa é uma pessoa diferente que segue conectada com a cadeia até chegar na venda ao consumidor final. Foi possível notar a importância do Fundo Rotativo Solidário para dar manutenção a estratégia de comercialização com participação em rede. A presença do INTA e o Ministério da Agricultura (Secretaria de Agricultura Familiar) na RAMA com abordagem agroecológica e apoio aos processos de desenvolvimento desde a produção ao produto artesanal foi um aprendizado bem interessante, onde é possível estimular a participação de órgãos governamentais em outras experiências de países no apoio às organizações de base ao desenvolvimento com abordagem agroecológica”, considera.

Desafios e lições para as mulheres algodoeiras na América Latina – A RAMA é formada por 13 organizações de base camponesa e duas instituições estatais de pesquisa e desenvolvimento, entre elas o INTA. Territorialmente está distribuída em 5 províncias da Argentina (Tucumán, Santiago del Estero, Buenos Aires, Chaco y Santa Fe). As mulheres que integram a rede estão há muito tempo envolvidas em sua própria organização.

Foto: Doriana/INTA

Segundo a técnica do Instituto Nacional de Tecnologia Agropecuária da Argentina (INTA), Doriana Feulliade, entre os principais desafios para a produção de fibras e alimentos são a redução dos riscos face à seca, o acesso a máquinas e ferramentas e a criação de um fundo rotativo próprio. A expectativa é que a  implementação do SPG impulsione a automonia da RAMA.

“O caminho mais importante é continuar nos fortalecendo internamente na articulação para agregar valor com metodologias e acordos que continuem a construir confiança e governança. Além disso, a visibilidade da agricultura familiar camponesa indígena como sujeito agrário e econômico que desenvolve economia e cultura, posicionando-se em mercados que valorizam a sustentabilidade. Estamos amadurecendo ideias para implementar o SPG. Esse sistema aliado a rastreabilidade nos permitirá continuar fortalecendo os processos de qualidade, autonomia e governança”, observa.

Foto: Doriana/INTA
Foto: Doriana/INTA

A programação do evento reuniu seminários, visita ao laboratório oficial que analisa a qualidade da fibra do algodão em Reconquista – Santa Fé e à unidade de descaroçamento do algodão no INTA. Ao final do evento, o Projeto Algodão/Diaconia também contribuiu para a elaboração de um plano de ações para dois anos (2023-2025) voltado a aspectos de produção, agregação de valor, organização e acesso a mercados do algodão.

“Algumas principais atividades de cooperação de conhecimento foram levantadas entre os Projetos: intercâmbios entre organizações de base; construção, participação de custo e estratégia de ajuste de preço da pluma de algodão e relações com o mercado; troca de produtos de geração de conhecimento do algodão agroecológico e formação de SPG; relatório sistemático do evento para dar visibilidade a apoiadores que possam financiar as ações dos Projetos”.

Visita ao laboratório de análise da fibra do algodão. Reconquista – Santa Fé, abril de 2023. Foto: América González/FAO

Projeto Algodão em Consórcios Agroecológicos – É uma iniciativa coordenada pela Diaconia e tem apoio financeiro da Laudes Foundation através do IDH – Sustainble Trade Initiative, da Inter-American Foundation (IAF), da V. Fair Trade e o Instituto Lojas Renner. No incentivo à gestão e disseminação do conhecimento, o Projeto é parceiro estratégico do FIDA/AKSAAM/UFV/IPPDS/FUNARBE e da Universidade Federal de Sergipe (UFS, Campus Sertão – Nossa Senhora da Glória/SE). Ainda é parceiro do SENAI Têxtil e Confecção da Paraíba, Projeto + Algodão – FAO/MRE-ABC/IBA/Governo do Paraguai, Programa Mundial de Alimentos (PMA) e o Projeto Algodão Agroecológico Potiguar no Rio Grande do Norte. A área de atuação é em 7 territórios e 6 estados na região semiárida do Nordeste do Brasil. Há colaboração com ONGs locais (Instituto Palmas – Alto Sertão de Alagoas, ONG Chapada – Sertão do Araripe/PE­ e Cáritas Diocesana de São Raimundo Nonato – Sertão do Piauí) para a expansão do cultivo do algodão consorciado e fortalecimento dos Organismos Participativos de Avaliação da Conformidade (OPACs) – Associações Rurais de Certificação Orgânica Participativa. No Sertão do Cariri, na Paraíba, o assessoramento técnico está sendo realizado pela Arribaçã, tendo ainda a parceria com o CEOP – Território do Curimataú/Seridó.  No Sertão do Pajeú (PE) e Sertão do Apodi (RN), a Diaconia mantém escritórios e atividades e se encarrega da implementação das ações locais do Projeto e parceria com CPT – RN.